Usar os recursos de forma intensiva, mas de maneira segura e sustentável e ao mesmo tempo produzir mais por unidade de área e/ou tempo. Em resumo, este é conceito de Intensificação Sustentável, tema escolhido para o primeiro “Agroenergia Convida”, uma série de lives mensais que a Embrapa Agroenergia realizará a partir de setembro. O episódio de estreia contou com a participação dos pesquisadores da Embrapa Agroenergia Maurício Antônio Lopes, ex-presidente da Embrapa, e Alexandre Alonso Alves, atual chefe-geral da Unidade.
No início da conversa, informal no formato mas densa no conteúdo, como definiu Alonso, Maurício Lopes contextualizou o tema para os espectadores. A intensificação sustentável, segundo ele, surge em meados da década de 1990 como resposta ao aumento da demanda mundial por alimentos. “Através da intensificação sustentável podemos harmonizar a relação da sociedade com a natureza. Esse é um tema que cresceu em importância, pois não é possível seguir em direção ao futuro com o padrão de produção e consumo que temos hoje”, acredita Lopes.
Para o Brasil, essa temática teria importância destacada uma vez que a maior parte do seu território fica no chamado “cinturão tropical”, onde estão as mais perfeitas condições para se exercitar o modelo de intensificação. “É possível, como já foi demonstrado pela agricultura brasileira, utilizar a terra o ano inteiro utilizando tecnologias amigáveis com a natureza”, disse o ex-presidente da Embrapa. “O Brasil pode ser tornar uma grande referência e padrão no desenvolvimento do conceito de intensificação sustentável”, complementou.
Biodiversidade x Bioinsumos
Como exemplo do que já foi feito no Brasil em intensificação sustentável, Lopes citou as tecnologias que aumentaram a fertilidade do solo, como o plantio direto na palha e a fixação biológica de nitrogênio, e outras como o desenvolvimento de variedades de ciclo curto que permitiram a combinação de safras.
Para Alexandre Alonso, o conceito de intensificação sustentável vai além da criação de novas variedades, processos e práticas agrícolas, já que a biodiversidade também pode ser utilizada de maneira inteligente e sustentável para desenvolver novos bioinsumos nas propriedades rurais, promovendo sua intensificação.
“Na Embrapa Agroenergia já trabalhamos sob esse conceito, desenvolvendo biofertilizantes, biodefensivos e bioativos a partir da rica biodiversidade brasileiras e de biomassas agrícolas. Na outra ponta, a intensificação do sistema como um todo também parte do pressuposto de que você precisa desenvolver novos processos industriais para a transformação de parte da biomassa em bioprodutos, biocombustíveis, bioenergia etc. Também atuamos nesse sentido desenvolvendo novos processos em três dos nossos quatro grandes eixos de pesquisa”, explicou Alonso.
“Talvez não seja demais pensar num futuro em que o negócio agrícola se sofistique a ponto de, com a intensificação que vai gerar mais coprodutos, resíduos e biomassa, abrir caminhos para desenvolver produtos interessantes que fluam das fazendas para as indústrias’, complementou Lopes.
Serviços ambientais e medição da sustentabilidade
A intensificação sustentável da agricultura do ponto de vista da prestação de relevantes serviços ambientais, não apenas mitigando as emissões de CO2 do sistema mas também promovendo a captura e o armazenamento no solo desse CO2, foi outro assunto debatido por Lopes e Alonso durante o Agroenergia Convida.
“Uma vertente interessante e que ainda precisa ser explorada (e a Embrapa Agroenergia tem tudo para atuar nisso) são os estudos de medidas de sustentabilidade como a Análise do Ciclo de Vida (ACV) de sistemas produtivos. A partir daí chegamos em números de descarbonização e ancoramos as nossas pesquisas no contexto de novas políticas públicas como o RenovaBio”, afirmou Alonso.
Para Lopes, sustentabilidade é um termo que vem se desgastando ao longo dos anos e, por esse motivo, é importante avançar mais no sentido de medir com números sólidos e boa ciência o impacto real das práticas sustentáveis que o Brasil vem adotando nos últimos anos.
O ex-presidente da Embrapa lembrou que a sociedade quer ter a informação do quão seguro são os processos e alimentos que está consumindo, e que há uma preocupação muito grande com a regeneração da capacidade do planeta para as gerações futuras. Segundo Lopes, a intensificação sustentável é pré-condição para alcançar modelos de produção mais sustentáveis no futuro.
“É inevitável que tenhamos de incorporar práticas que nos permitam medir como estamos avançando na direção de modelos mais sustentáveis de produção”, afirmou.
Cana-de-açúcar: um exemplo
Um exemplo de cultura onde a intensificação sustentável pode ser claramente percebida é a cana-de-açúcar, gramínea da qual não se desperdiça nada. “O Brasil aprendeu a usar essa espécie de maneira extremamente sofisticada”, exemplificou Maurício Lopes, citando os inúmeros usos da planta como a produção de combustível renovável e bioeletricidade.
“O setor de biocombustíveis e bioenergia é um exemplo desse modelo de intensificação em que, como foi citado, a cana-de-açúcar é uma referência interessante da qual se produz um alimento (açúcar), um biocombustível (etanol), bioeletricidade (bagaço). Novas tecnologias permitirão num futuro breve a obtenção de combustíveis de segunda geração, além de polímeros, plásticos e combustíveis avançados”, complementou Alexandre Alonso. “ Cada vez que você coloca um componente novo nesse sistema, um produto novo, você acaba intensificando o sistema como um todo”, complementou.
Políticas públicas
Conhecimento e boas políticas públicas são, na opinião de Lopes, as duas coisas que marcaram a trajetória da agricultura brasileira. “O Brasil tem sido ao longo dos últimos anos pródigo no desenvolvimento de políticas públicas para a alimentação”, disse. Código Florestal, RenovaBio e Plano ABC foram exemplos de políticas públicas citadas por Lopes que permitiram o desenvolvimento de um modelo de agricultura intensificada com apoio da agricultura de baixo carbono.
Alonso complementa que, aliado a estes fatores, há ainda o empreendedorismo do produtor rural brasileiro, sempre disposto a adotar novas tecnologias e explorar novos mercados. E tudo isso com sustentabilidade, usando de maneira racional os recursos disponíveis.
“A RenovaCalc (a calculadora do RenovaBio) mostrou de maneira bastante clara que é de fato possível fazer agricultura intensiva e ainda descarbonizar a economia, a atmosfera, a partir da diferença entre as emissões de CO2 do combustível renovável e dos combustíveis fósseis que deixam de ser utilizados”, complementou Alonso.
Novos mercados
Para Lopes, a agricultura também abre caminhos para se impactar de forma positiva muitas outras cadeias produtivas e vertentes de negócio. “Indústrias inteiras poderão ser impactadas na medida em que intensificamos a agricultura”, afirmou.
Ao imaginarem o futuro, Lopes e Alonso destacaram que as novas tecnologias da informação e comunicação geram oportunidades de aplicações específicas e permitirão um salto e um ganho no conceito de intensificação sustentável.
A utilização da robótica, as fazendas verticais, a automação dos sistemas e o manejo sitio-específico com o uso de drones e aplicação de algoritmos foram algumas das inovações já existentes mencionadas por Lopes. Alexandre Alonso complementou: “As fazendas poderão ser integradas também às chamadas ‘biorrefinarias’, permitindo a produção de uma grande variedade de bioprodutos a partir da biomassa. Essa e outras áreas onde a Embrapa Agroenergia atua de maneira destacada são um novo campo de futuro”, complementou.
Para Maurício Lopes, é preciso olhar a intensificação sustentável também na perspectiva social. “Vejo uma oportunidade para a agricultura fazer uma interface mais forte com a vertente da gastronomia, com o aumento de espécies para prover novos sabores e alimentos, numa interrelação também com o turismo, de forma a alcançar outras cadeias de valor e oportunidades de criação de riqueza, bem-estar e fortalecimento da cultura local”, afirmou.
Para concluir, Lopes disse o grande desafio que se impõe é “harmonizar a agricultura com a natureza”. Não é possível, segundo o pesquisador, continuar com o modelo de produção e consumo atuais. “A natureza é naturalmente intensificada. O conceito de economia circular é uma tentativa de mimetizar o que a natureza já faz”.
O vídeo do primeiro Agroenergia Convida está disponível aqui.
Para Maurício Lopes, é preciso olhar a intensificação sustentável também na perspectiva social. “Vejo uma oportunidade para a agricultura fazer uma interface mais forte com a vertente da gastronomia, com o aumento de espécies para prover novos sabores e alimentos, numa interrelação também com o turismo, de forma a alcançar outras cadeias de valor e oportunidades de criação de riqueza, bem-estar e fortalecimento da cultura local”, afirmou.
Irene Santana (Mtb 11.354/DF)
Embrapa Agroenergia
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