Projetos de três unidades da Embrapa acabam de ser beneficiados com recursos da Universidade de Nottingham (UoN), Reino Unido. A articulação, que resultou na cooperação científica foi liderada pelo Labex Europa, que, durante dois anos, coordenou a preparação do acordo firmado no âmbito do Programa Future Food – Beacon of Excellence, parte de um programa de investimento nas áreas de ciência das plantas e animais. O foco da iniciativa é a integração da pesquisa direcionada por desafios, treinamentos e atividades de intercâmbio de conhecimento. Serão beneficiados seis projetos, da Embrapa Arroz e Feijão (3), Embrapa Gado de Leite (2) e Embrapa Trigo (1).
Segundo o pesquisador Pedro Machado, então coordenador do Labex Europa (2016-2019), depois de visitas de delegações da instituição ao Brasil, foram identificados na Embrapa pontos de interesse comum que poderiam resultar em cooperações. “Foram feitos contatos com as unidades descentralizadas que tinham em seus portfólios e projetos em andamento no SEG alguma relação com as linhas de pesquisa do programa nas quais havia interesse em colaborar”, contou ele.
Os projetos incluídos na cooperação científica são “Avaliação de cultivares brasileiras de trigo e cevada quanto à tolerância de germinação na espiga em pré-colheita” (Embrapa Trigo, liderado pelo pesquisador Pedro Scheeren); “Multimicrobioma alimentar e sua associação com a eficiência alimentar em bovinos leiteiros” e “Multimicrobioma do rúmen e sua associação com a eficiência alimentar e as emissões de metano em bovinos leiteiros” (Embrapa Gado de Leite, ambos liderados pela pesquisadora Mariana Campos); “Avaliação da intensificação sustentável de sistemas ILPF no Brasil”, “Melhorando a tolerância combinatória ao estresse abiótico em arroz de terras altas” e “Alimentos nutritivos à base de feijão – Melhoria do conteúdo de minerais por meio da triagem ionômica” (da Embrapa Arroz e Feijão, liderados por Carlos Magri, e pelos pesquisadores Adriano Castro e Priscila Bassinello, respectivamente).
Na opinião de Vinícius Guimarães, atual coordenador do Labex Europa, o resultado da negociação trouxe oportunidades para a pesquisa, mas demandou esforço na articulação e envolveu a participação dos dois coordenadores do Labex, o anterior e o atual. “Trabalhamos juntos no alinhamento às exigências contratuais até a liberação dos recursos no Brasil, por meio da Fundação Arthur Bernardes – Funarbe”, explicou. “Apesar de todas as dificuldades, continuaremos com estreita relação com uma importante instituição, além do apoio financeiro para as pesquisas em momento de restrição orçamentária”.
Resultados promissores
O especialista Carlos Magri, da Embrapa Arroz e Feijão, coordena o projeto responsável por elaborar uma ferramenta, a partir da qual será possível fazer levantamentos nas propriedades rurais, incluindo as práticas usadas para a produção, participação na renda das diferentes atividades econômicas e ainda o monitorar perspectivas de competitividade na atividade leiteira e impactos ambientais decorrentes de outras ações na propriedade. “A proposta tem o objetivo de construir métodos para a conscientização da sustentabilidade em sistemas de cultivo brasileiros”, disse, ressaltando ter sido esse o principal aspecto que despertou o interesse da instituição estrangeira.
Com o recurso da Universidade de Nottingham, o pesquisador explica que a ferramenta em construção poderá ser transformada numa ferramenta computacional e utilizada em outras regiões. “Os produtores terão uma contabilidade não só financeira, mas ambiental e social de seu negócio, e a pesquisa agrícola terá uma real avaliação de impactos das tecnologias usadas, simular impactos de pesquisas em andamento, além de ser uma fonte de captação de demandas”, comentou. Para Magri, existe ainda a possibilidade de ser usada como fonte de informações para formulação de políticas públicas ou indicativos relacionados a investimentos que favoreçam o produtor.
Na área de nutrição e saúde humana, o projeto liderado pela pesquisadora Priscila Bassinello, também da Embrapa Arroz e Feijão, objetiva a triagem e a seleção de materiais com maiores conteúdos de alguns minerais, que estejam biodisponíveis para aproveitamento pelo organismo humano. “A ideia é encontrar fontes mais ricas nesses minerais, a partir das quais possam ser desenvolvidos produtos à base desses feijões mais nutritivos e farinhas para indústria de alimentos, proporcionando dietas mais ricas”, disse, ressaltando o potencial de aproveitamento como fonte de proteína vegetal análoga à proteína animal.
Segundo ela, o objetivo inicialmente é promover, na Universidade de Nottingham, a triagem de 340 genótipos por meio do método ionômico. “Nós realizamos a seleção, a multiplicação no campo, o preparo das amostras (transformada em farinha), mas a análise será feita na instituição parceira”, explicou. O interesse dos pesquisadores da UoN é a variabilidade genética do feijoeiro, que pertence ao grupo das pulses, atualmente em destaque na pauta de produtos benéficos à saúde.
Priscila acredita que a parceria vai contribuir com o desenvolvimento de produtos à base de feijão, diversificando opções de dieta para o consumidor. Ela destacou ainda a possibilidade de novas pesquisas envolvendo bioensaios, ou seja testes para avaliação real do consumo na saúde humana. A cooperação bilateral também prevê o custeio de capacitações e treinamentos de pesquisadores da Embrapa e da Universidade de Nottingham em seus respectivos laboratórios e campos experimentais.
Arroz de terras altas
Da mesma unidade, o pesquisador Adriano Castro coordena o projeto Melhorando a tolerância combinatória ao estresse abiótico em arroz de terras altas, denominado Sustentarroz, liderado pela pesquisadora Anna Cristina Lanna. “O estudo pretende desenvolver formas de mitigar os efeitos da deficiência hídrica e da baixa disponibilidade de fósforo no solo do Cerrado, pelo uso de bioinsumos e adubação”, disse.
Serão utilizados microrganismos multifuncionais, disponíveis no banco de germoplasma da Embrapa Arroz e Feijão, e silício, como estratégia para redução dos problemas causados pelos estresses. O pesquisador explica que resultados prévios já demonstraram haver grande potencial na utilização dos microrganismos e silício. “Nesse projeto buscamos usar níveis distintos de fósforo e água, genótipos tolerantes e suscetíveis, microrganismos e silício, para avaliar a resposta da planta”, completa.
O interesse da instituição estrangeira, segundo ele, deve-se ao fato de a Universidade de Nottingham, através do Future Food Beacon, reconhecer o grande potencial na cultura do arroz de terras altas para enfrentar o desafio de fornecer quantidades suficientes de alimentos a uma população crescente em um ambiente de mudanças climáticas. O recurso investido será utilizado para a condução das atividades de pesquisa e manutenção de um estudante brasileiro de doutorado na Universidade de Nottingham, que deverá trabalhar no processamento e análise de amostras coletadas nos experimentos conduzidos no Brasil e em Nottingham.
Identificação de novos marcadores genéticos
De acordo com Pedro Luiz Scheeren, pesquisador da Embrapa Trigo e coordenador do Projeto de Melhoramento de Trigo para o Brasil, a pesquisa que será realizada em parceria com a Universidade de Nottingham é sobre o estresse causado pelo excesso de chuvas no final do ciclo do trigo e da cevada, causando a germinação na espiga em pré-colheita (GPC). “Este é um problema comum nos dois países e este estudo visa a caracterização detalhada de um conjunto de cultivares brasileiras de trigo e de cevada em relação à tolerância à GPC”, explica ele.
A caracterização (fenotipagem) em relação à GPC será realizada em duas etapas: na maturação fisiológica das sementes e na maturação de colheita. A partir da caracterização, algumas cultivares serão selecionadas para realizar cruzamentos estratégicos para a formação de populações que possibilitem estudos de herança e ajudem no entendimento da transmissão genética da resistência à germinação. “A fenotipagem será realizada na Embrapa Trigo e a genotipagem das linhagens das populações criadas ficará a cargo da UoN”, explicou.
A vantagem da parceria entre as duas instituições no desenvolvimento do projeto é o conhecimento e a identificação de novos marcadores genéticos, facilitará a identificação de genótipos mais resistentes e reduzirá o tempo para a seleção e criação de novas cultivares de trigo e cevada mais resistentes à GPC. “Toda a cadeia desses cereais será beneficiada, desde os produtores de trigo e cevada, produzindo grãos com melhor qualidade física, até os consumidores, que terão acesso a produtos processados de melhor qualidade”, completou.
Eficiência alimentar e emissões de metano
Da Embrapa Gado de Leite, dois projetos serão beneficiados com a cooperação, ambos coordenados pela pesquisadora Mariana Campos. Um tem o objetivo de estabelecer as relações entre eficiência alimentar e emissões de metano de animais Girolando, do nascimento até o final da primeira lactação, e correlacionar a emissão de metano, os índices de eficiência alimentar e o desempenho animal ao sequenciamento genético da microbioma ruminal, além de identificar os biomarcadores para animais mais eficientes. E o segundo prevê a avaliação da associação da eficiência alimentar e o status imunológico, o microbioma ruminal, vaginal e do leite de bovinos leiteiros das raças Holandês (que será realizado no reino Unido) e Gir (que será realizado na Embrapa Gado de Leite).
“A importância da parceria, além do know how da Universidade de Nottingham, é a possibilidade de recursos para o fazer o sequenciamento do microbioma dos animais dos projetos aprovados e avaliar possíveis biomarcardores para animais mais eficientes, em relação à eficiência alimentar, ou seja, animais que consomem menos e produzem a mesma quantidade ou quantidade maior de leite”, explica ela. “Como a nutrição é a parte mais cara no sistema de produção, quanto mais eficientes são esses animais em relação à eficiência alimentar, mais rentáveis e lucrativos podem são os sistemas e consequentemente, será mais interessante para o produtor”, conclui a pesquisadora.
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